Monday, September 10, 2012



MILES
“Half my life is over, and I have nothing to show for it. I'm a
thumbprint on the window of a skyscraper. I'm a smudge of excrement
on a tissue surging out to sea with a million tons of raw sewage.”

JACK
“See? Right there. Just what you just said. That's beautiful. A thumbprint on a skyscraper. I couldn't write that.”

MILES
“Neither could I. I think it's Bukowski.”

Sideways, 2004


Thursday, August 30, 2012

Faço um bolo novo velho. Cada ingrediente acumulado à massa informe é uma repetição dos gestos da minha mãe que eu observava atentamente enquanto produzia o meu alimento. Sentindo tanta admiração por ela que não a queria largar da minha vista, gravando todos os gestos que ela tornava sistemáticos para mim. Para que eu pudesse armazenar junto de outras utilidades para o futuro porvir. "Bate-se o bolo com amor, até fazer bolhinhas de ar. Senão não cresce.", dizia-me a minha mãe. E eu, com quatro anos de idade, ainda não compreendia na sua completude o que era o amor, porque o amor era naquela altura uma presença assídua e reconfortante. Na memória dos sentimentos guardava só mesmo a dor física súbita e momentânea das minhas mãos enroladas em tecido branco corrido. Marcadas por tê-las metido dentro do forno a escaldar, num espaço temporal em que a minha mãe retribuía amor à massa do bolo. Depois foram as marcas das minhas mãos que foram desaparecendo com o amor disciplinado da minha mãe. O mesmo que fazia um bolo crescer dentro do forno.

Tuesday, August 28, 2012

Forma-se cadência de ânimo firme perante o que se pensava ser arbítrio e afinal recusa-se a sê-lo. Não lhe pertencendo carácter de propagação da realidade no cosmos obstruído, corrompido e vergado pela História. Mesmo por Aquela em que as autodeterminações ainda não eram presentes e um Espírito gozava de morada certa na grande escuridão. Mas já depois de ter inventado tudo, por receio aos pecados da carne que motivam o ânimo continuado das vontades, que mesmo assim fez urdir mais tarde juntamente com a culpa. É assim que fazemos com que a cadência das vontades se perpétue e se sacie de uma realidade quebrantada, já com vício na sua concepção. E se estamos todos aqui é porque essa realidade venceu-nos e achámo-nos circunscritos ao mesmo ar e às mesmas minuciosidades que deveriam distinguir-nos entre nós. Em que o brado da aflição ficou contido em forma de puzzle para nos totalizar num rumorejo todo igual.

Saturday, March 17, 2012

e um dia faço mesmo um retrato da dúvida para denunciá-la a toda a gente, assim que a materialize.

Havendo duas vontades contrapostas que seriam uma irrepreensível e a outra questionável, o que acabou por interessar verdadeiramente é que, acontecendo com toda a certeza disparate complementado por uma ideia bem fundamentada, revelou-se a hesitação em aplicar bom senso e discernimento para saber qual seria qual e em que afiguração deveria surgir uma perante a outra.
Foi na senda desse problema que se tentou promover discussões instruídas, delineação de critérios criteriosos e até meditação metafísica. Pois que nada disto iria concretizar o que quer que fosse, mantendo-se tudo no campo da abstracção.
Até que se rejeitou o Ego para deixar de ser na primeira pessoa, sendo que essas vontades contrapostas passaram a achar-se na posse do interesse do colectivo. Pretendia-se, assim, dizer adeus ao denominado assédio d’Alma. Adeus àquelas vontades, uma irrepreensível e a outra questionável, sem saber qual seria qual. E o adeus às irresoluções do passado.
Venho agora confessar que isto não durou muito tempo. Uns segundos da vida até.
A razão foi que acabei por ter tanto gozo no esforço de consumar a dúvida que não poderia deixá-la assim em mãos alheias.