Saturday, October 18, 2008

O Pensamento

Tudo começou com um erro.
O início improvável de todos é sempre a estatística. Uma probabilidade de 1 em milhões contidos em centímetros cúbicos.
Mais do que probabilidade inerente à própria vida, foi um erro inconsciente. Um acto de inconsciência instintiva de acasalamento.
Todos os anos ele festejava esse erro com uma epifania enquanto acto consciente repetido exaustivamente até que a incerteza se omitisse. Logo a seguir à massagem rotineira na zona central pélvica. Ritual de que não poderia abdicar por lhe proporcionar o único prazer controlável e acessível à sua vontade.
E a meditação anual não poderia ser desperdiçada com pensamentos vulgares iguais aos dos outros dias. Era por isso que primeiro acalmava o corpo antes de usar a mente. Desenferrujá-la contra a regra anestésica vigente.
O amor não era expressão pertencente áqueles lábios gretados. Unidos em simbiose cínica e expressos silenciosamente em desejo de morte em vida.
Por isso, o único desejo a que ele se permitia aceder expressava-se num único pensamento livre por ano, apenas limitado pelo acesso que ele tinha às experiências. Era livre até certo ponto. O ponto do que seria directamente observável.

O pensamento:

"Abro a mão que acolhe inusitada o visco reprodutor da natureza.

Um passo verdadeiro que se comprometeu em lástima imperceptível.

Que trepou paredes desinfestadas de probabilidade,

Sem cumprir objectivo.

Um erro que evita outro erro."