Sunday, June 29, 2008

"Considerando-a cativa achou-se nela perdendo-se."

Inspiro com convicção redobrada, dispo a pouca roupa que tinha e deito-me. O meu corpo funde-se e transforma-se em alimento cíclico. Com os olhos fechados estimulo a fêmea vasta que tenho à distância de um milímetro de pele e faço amor com ela até o meu sémen queimá-la por dentro. A fêmea abraça-me e envolve-me dentro dela. Sei que nunca iria possuí-la porque o apelo foi sempre dela. Apercebo-me agora que fui manipulado e mesmo assim sei que todos os pormenores da vida reconduziram-me àquele. Se isto termina eu morro. Digo. Podes ficar aqui para sempre. Ela responde-me. Não posso. Sim podes, só por quereres. Eu quero mas não posso. Porquê? Não sei. Sabes. Sim sei. Então porquê. Porque vivi e vivo para este momento mas não o sabia. E agora já sabes e queres ir-te embora. Sim. É a tua decisão. Eu sei. Com a convicção ainda toldada pelo prazer levanto-me e começo a correr para outro local que me desconhece. Quando chegar ao meu destino sei que onde estive já será indiferente à minha memória. Uma serpente incomodada com o meu movimento inconstante morde-me. Não me importo. É assim que me apercebo de que ainda sobrevivo.

Friday, June 20, 2008

Unfaithful therapy

Apenas queria despejar o meu corpo descarnado em camas alheias e mortas. Mas essas camas que me foram reveladas através da noite e que me eram estranhas pertenciam a todos e, em especial, a mim.


A partir da tua existência, quando anoitecia - se anoitecia – comecei a observar-te apenas através dos espelhos da minha casa no teu deambular inconclusivo. Mas nunca conheci a razão. A conclusão era só tua e não querias – e nem pretendias - partilhá-la comigo.

Enchi então as paredes de reflexos espelhados e, fosses um gato sem cio, ganhava a tua confiança para que descansasses acomodado nos meus braços sem que viesses a pertencer-me algum dia. Como felino com instinto que sempre foste, fugiste-me através do reflexo da janela escancarada por esquecimento para que pudesses encontrar a cópula que nunca iria preencher-te.

Agora estou aqui. Prostada numa cama alheia a ti, olho pacientemente para o já único espelho de minha casa. Os outros fui destruindo em vão. Comecei a sentir-me peregrina sem terra por (re)ver-me sem a tua imagem ao lado da minha. Embora já não me lembre de como eras - se o foste.

Das feições incógnitas descritas na minha mente apenas tenho a percepção de que eras melhor do que eu. Mais belo. Mais inacessível. Menos alheio por não possuíres um leito onde pudesses repousar. Só a minha alma te pertencia. Mas até disso serias capaz de abdicar se pudesses.

Por isso, ainda hoje há uma parte dela que responde com dor à tua ausência e com alegria ao esquecimento. O resto do que eu sou é devoção acomodada.